I. O CONCEITO DE JUSTIÇA SOCIAL:
Comecemos pela palavra “justiça” (do latim iustita, ae). Esta detém conotações diversas e ser utilizadas em vários sentidos e vejamos:
- Justiça cósmica: ocupação por cada coisa do seu lugar e adequação ao seu fim, segundo a lei reguladora da ordem universal.
- Justiça divina: é a infalível perfeição da vontade de Deus e da sua actuação em relação aos homens.
-Justiça univesal: virtude ética total ou plenitude da bondade moral que na perspectiva bíblica e cristã, é sinonimo de santidade.
-Justiça particular: diz respeito as relações sociais e consistente no hábito da vontade que inclina o homem a dar a cada um o seu direito.
-Justiça objectiva: é a simples atribuição a cada um do que lhe é devido, qualquer que seja o ânimo do agente.
- Justiça funcional e institucional: é actividade jurisdicional ou de administração da justiça.
-Justiça legal: é a norma, valor, fim ou principio regulador da vida social, politica e jurídica, com conteúdo e alcance variáveis consoante as concepções adoptadas.
A JUSTIÇA EM ARISTOTELES
Aristóteles nasceu em Estagira, na Calcídica (384 a.C. - 322 a.C.). Filósofo grego, aluno de Platão e professor de Alexandre, o Grande, é considerado um dos maiores pensadores de todos os tempos e criador do pensamento lógico.
A obra Ética a Nicómano (foi o pai) espelha a ideia que Aristóteles tem de justiça social. É uma obra sobre a ética. A razão é orientada para um fim. Quem determina este fim é a ética. E a finalidade suprema é a felicidade que consiste na vida virtuosa. Virtude consiste em fazer uma acção bem feita, na justa medida.
Esta ideia de justiça de Aristóteles encontra-se na obra Ética a Nicómano.
A concepção de justiça em Aristóteles é mais nítida. Ele distingue entre a justiça geral, conceito que não difere substancialmente do conceito de justiça de Platão e a justiça particular, noção que mais se aproxima ao Direito.
Segundo Aristóteles, a Justiça particular é uma virtude puramente social. Assim sendo, o homem é justo quando habitualmente não retira mais do que a sua parte dos bens em disputa no grupo social, nem menos do que a sua parte das dívidas, dos encargos e dos trabalhos.
A justiça como virtude particular de natureza exclusivamente social, é concernente à repartição de bens entre os homens e tendo como objecto a atribuição a cada um do que é seu, ou seja, o seu direito, segundo um critério de igualdade.
O Direito Romano, na linha da tradição aristotélica, consagrou, dando-lhe expressão prática, as noções de justiça, como “ constante e perpetua vontade de dar a cada um o seu direito), e da jurisprudência, como conhecimento das coisas divinas e humanas, ciência do justo e do injusto.
A JUSTIÇA EM S. AGOSTINHO.
Agostinho de Hipona nasceu em Tagaste, 13 de Novembro de 354 e morreu em Hipona, 28 de Agosto de 430 foi um bispo católico, teólogo e filósofo, considerado pelos católicos santo e Doutor da Igreja.
Agostinho tem um conceito de justiça que se baseia na concepção judaico-cristã, que reporta-se a Deus e à Sua Lei, que visa o Paraíso.
A Lei de Deus, critério de justiça distingue-se com dificuldade da Moral e concretiza-se na Santidade. A Justiça está mais próxima de viver honestamente.
Enfim, a concepção de justiça de Agostinho propõe uma ordem global de vida individual e em sociedade.
A JUSTIÇA EM S. TOMAS DE AQUINO.
São Tomás de Aquino nasceu em Roccasecca em 1225 e faleceu em Fossanova, 7 de Março 1274) foi um frade dominicano, teólogo, distinto expoente da escolástica, proclamado santo e cognominado Doctor Communis ou Doctor Angelicus pela Igreja Católica.
É na sua obra “Suma Teológica” que vai contribuir para o conceito de justiça social. Nesta obra desenvolve uma doutrina sistemática da justiça como virtude cardeal, de índole social, definindo-a como hábito segundo o qual, com constante e perpétua vontade, se dá a cada qual o seu direito.
Aqui, a justiça assume a modalidade da relação social. É a virtude que relaciona e vincula os homens entre si e na sociedade segundo o critério de igualdade. No conceito de Tomas, é justo o que corresponde ao outro segundo a igualdade.
Daqui deriva a definição de Tomas de Aquino: a justiça é a virtude pela qual se atribui a cada um o seu com vontade constante e perfeita.
II. AS RAÍZES ANTROPOLOGICAS DA JUSTIÇA SOCIAL.
Há três raízes fundamentais que iluminam o sentido de justiça que são: a pessoa, o outro e a sociedade.
A PESSOA. A PRIMEIRA RAIZ ANTROPOLÓGICA DA JUSTIÇA SOCIAL:
A busca do sentido do homem conduz-nos, através dos diferentes níveis de consideração, à descoberta de que no fundo de toda essa complexa realidade que chamamos “ser humano” aparece a “pessoa” como núcleo último irredutível. A pessoa constitui o “centro da existência humana”, (Karl Rahner). A pessoa é como que a estrutura última de todo o humano. Pela sua importância na compreensão do horizonte antropológico da justiça, vamos a seguir definir os traços mais pertinentes do ser pessoa.
A PESSOA COMO IPSEIDADE E RELACIONALIDADE:
Há duas dimensões que concorrem para a entidade última do ser pessoa e que são inseparáveis e complementares: a ipseidade e a relacionalidade.
A ipseidade é uma componente ontológica da pessoa que alude à realidade mais profunda de sustentação do ser humano. É a dimensão do “em si”, a fonte das iniciativas pessoais. Isto funda a ideia de que a pessoa humana é irredutível a um objecto, sendo um ego.sujeito inviolável, livre, criativo e responsável. O “ser-si-mesmo” encontra-se de uma ou outra maneira em todos os fenómenos humanos. Onde esta falha não se realiza mais o homem enquanto homem.
A ipseidade abre-nos definitivamente a pessoa enquanto capaz de assumir-se a si mesmo.
A Relacionalidade: alude àquela componente igualmente constitutiva da pessoa que impede que o “em si” se esgoste na esterilidade de uma impossível auto-realização sem rosto. Este é o rosto projectivo do “em si” da pessoa; sua dimensão de “ser-em-relação” (o ser-com e o ser-para). Sem relacionalidade fica mutilado o sentido real do “eu”. A explicação do “eu” inclui a presença do outro: a relacionalidade torna-se indispensável para a compreensão da ipseidade.
No entanto, na relacionalidade encontramos já, a nível ontológico, o primeiro apoio antropológico sobre o qual se deve fundamentar a justiça. Essa se estabelece sobre a base de uma adequada harmonia das pessoas consigo mesmas e da rectidão de relações com os demais.
A PESSOA COMO SUBJECTIVIDADE E ALTERIDADE:
A pessoa vive numa tensão relacional entre a subjectividade e a alteridade (o outro). Nenhuma pessoa está fechada em si mesma. Todas as correntes ideológicas da história que quiseram encerrar o homem em si mesmo, procurando absolutizar as suas prerrogativas ôntico-axiologicas sem referencia ao outro, desembocaram inevitavelmente num subjectivismo/individualismo fechado. De facto, a pessoa humana só realiza na medida em que está em relação com os demais, através duma dinâmica dialogal.
Entretanto, existe uma alteridade horizontal e outra vertical. A alteridade horizontal é aquela que nos coloca diante do nosso semelhante (o outro que é como eu). Daqui decorre a justiça horizontal, aquela relacionada aos outros numa reciprocidade simétrica entre a auto-realização e a altero-realização. Não existe aquela sem esta. Do ponto de vista da realização social do homem, a auto-realização equivale sempre a altero- realização, pois o homem não persegue uma realização intimística, orientada para dentro de si, mas para fora. Neste sentido podemos dizer que o existir humano é um co-existir, o viver humano é um com-viver. Assim, a consciência-experiencia da subjectividade é contemporaneamente consciência experiência da alteridade.
Alteridade vertical coloca-nos numa inter-relação transcendente com o Ser supremo, o totalmente Outro, o Tu Absoluto. Aqui não existe uma relação de reciprocidade simétrica, mas uma relação de dependência ontológico-criatural da pessoa humana do Ser Supremo e transcendente. Decorre desta relação a chamada justiça teologal que consiste em atribuir a Deus tudo aquilo que lhe é devido: Reconhecimento, honra, gloria, adoração.
III. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DE JUSTIÇA SOCIAL.
A génese de justiça social:
O Direito com uma concepção mais pessoal e real, proporcionou à justiça um carácter dinâmico e mais reformista da ordem a garantir. “ passou-se da concepção do direito e da justiça como manutenção da ordem social a uma concepção dinâmica do direito e da justiça como postulado de mudança social” (Dicionario Teologia Moral, pg. 679).
Trata-se em primeiro lugar em salvaguardar o direito primário da pessoa humana no contexto de uma sociedade em transformação. Justiça liberta-se de uma legalidade solidificada sobre um modelo passado de vida económico-politico-social para estar mais aberta a receber as exigências de liberdade e igualdade demandadas pelos novos sistemas técnico-produtivas e pelas novas sensibilidades da consciência humana.
Estamos a nos referir da justiça legal para que possa encontrar o carácter e o papel da justiça geral (S. Tomás). É uma questão de devolver à justiça legal o seu objecto específico que é o bem comum.
A partir destas novas concepções nestes contextos desenvolve-se na história a noção de justiça social. A sociedade moderna é sensível as questões de justiça social e já não se reduz a um apanágio socialista, até porque o magistério social da Igreja, a partir da encíclica Quadragésimo anno, de Pio XI (1931) tornou-se um indicativo magisterial de notável alcance e incidência ético-social.
A justiça submerge como uma consciência crítica, e denuncia todas as injustiças cometidas em nome da lei, das instituições e estruturas na qual esta toma corpo. Ou seja, não se deve considerar a lei a norma que não seja justa. A justiça social encarrega-se de todos os desajustes entre lei e direito e esforça-se por restabelecer sua harmonia.
A justiça social, como consciência inovadora procura estabelecer efectivamente uma nova ordem social, ou seja, à justiça exigida para os novos problemas do mundo de hoje. A justiça social surge assim como justiça do bem comum entendido em relação com os novos equilíbrios que é preciso determinar ou predeterminar para sua garantia. Desta feita a justiça social tem carácter “incoativo”; uma vez adquiridas para a justiça legal as novas exigências. A Justiça social tem também carácter profético porque tende a prevenir as injustiças do sistema, a alargar os confins do direito e de sua tutela institucional, exercendo um papel preventivo dos conflitos e violência sociais e garante da paz social.
Sendo assim, podemos dizer que a justiça social esta estreitamente relacionada com a questão social, ou seja com os diversos desequilíbrios nas relações sociais determinados pelas mudanças cientifico-tecnicas e económico-produtivos, evidenciadas por uma mais aguda consciência dos direitos humanos e por si mesmas pedem nova justiça.
A primeira questão social, na qual se busca a formação mesma da noção de justiça social foi a questão operaria, nascida com a revolução industrial no Século XIX, numa época de grandes transformações sociais.
“Segundo Pierre Léon, o que é novo no século XIX não é o facto de haver dominação dos países poderosos (militar, tecnológica e economicamente, sobre outros menos aptos para o desenvolvimento e par a independência. Este tipo de dominação vinha já de séculos anteriores. A novidade do século XIX surge, segundo aquele historiador, ao nível da intensidade e da espessura das terras económicas, do fluxo de saída de homens e para fora da Europa e da substituição das correntes e dos interesses seculares dos negócios pelas obrigações da industrialização desigual no Mundo… O “subdesenvolvimento”, herdeiro do conceito do “mundo dominado” ou “atrasado”, revelar-se-à no século XX e será resultante do explosivo encontro entre dinamismo demográfico e fraco desenvolvimento económico (Pedro Almiro Neves et alli, Historia, 2º volume.)
A revolução industrial pode ser vista como um processo pelo qual a sociedade adquiriu domínio sobre grandes fontes de energia inanimada, desenvolvendo e empregando a tecnica, ou seja a aplicação dos princípios científicos às actividades económicas. Surgem em consequência desta revolução industrial, transformações profundas nas estruturas institucional, cultural, politica e social.
A tradicional divisão da justiça (tipologia da justiça) não respondia suficientemente ao conflito patrões-operarios. A origem do conflito é empresa capitalista, a proletarização do trabalho, as mudanças radicais nas relações produtivas. Há aqui princípio e causa de grandes injustiças, autoproduzidas em sistema perverso de multiplicação de lucros e de exploração do trabalho. Perante este cenário, a chamada justiça legal estava inoperante ou era cúmplice, provocando graves consequências sobre o bem comum e para a paz social.
A questão social adquiriu hoje dimensões mundiais. “Converteu-se em questão de subdsenvolvimento”( Paulo VI, Populorum Progressio; João Paulo II, Solicitude rei socialis, 9-10).
Sabe-se que a questão operária e a questão dramática do subdesenvolvimento são determinados pelo lucro desmedido e exploração em escala mundial reduzindo à miséria e à fome povos e continentes inteiros.
A questão operaria e do subdesenvolvimento popularizou a atenção da justiça social. Não queremos aqui silenciar outras questões que surgem no tecido social. No entanto há que começar a reflectir seriamente na questão social em relação com a segregação de todos os diferentes;
Uma questão feminina de emancipação e paridade de dignidade da mulher;
Uma questão dos anciãos em relação com o envelhecimento da população e segurança de velhice.
Uma questão demográfica motivada pela superpopulação mundial;
Uma questão ecológica, pela degradação do meio ambiente e as alterações da biosfera;
Uma questão nuclear em relação com o risco radioactivo.
Perante estas questões a justiça social surge como justiça de nova ordem social; uma ordem de instituições e estruturas nas quais tome corpo a justiça, a fim de que a sociedade possa desenvolver-se em harmonia e beneficiosa “sinergia”
IV. O UNIVESAL HUMANO DA JUSTIÇA.
A ideia de justiça é conceito imposto à consciência como critério exiológico-normativo. Coexiste com a consciência ética da humanidade e do indivíduo.
SIGNIFICADO GERAL E ESPECIFICO DE JUSTIÇA:
A justiça identificada com a moralidade é a virtude que induz a cumprir o devido como simples exigência da ordem e da harmonia.
O significado geral da justiça apresenta-se como uma atitude que consciente à instância ética do “dever” e ordena seu cumprimento. A Justiça é neste sentido a expressão da moralidade humana: atitude adequada.
O significado geral nos remete para o conceito aristotélico da justiça como virtude que convida a cumprir o que é justo; para a definição de justiça de Platão: “fazer cada um o seu”.
Por seu lado o significado específico de justiça assume como modalidade da relação social. É a atitude que relaciona e vincula os homens os homens entre si e na sociedade segundo o critério de igualdade.
Os aspectos distintivos da justiça são: a alteridade: a justiça diz sempre e por si mesma relação ao outro, pois não existe justiça para consigo mesmo; a obrigatoriedade: o dever de sujeito agente correlativo ao direito do outro a exigir respeito e reparação; a igualdade: que estabelece a qualidade da relação e a medida do devido: “é justo o que corresponde ao outro segundo a igualdade” (S. Tomás de Aquino): Justiça é a virtude pela qual se atribui a cada um o seu com vontade constante e perfeita.
DIREITO E JUSTIÇA: A ORDEM JURIDICA E ORDEM MORAL DA JUSTIÇA.
A justiça é a atitude humana suscitada pela presença do direito. O Direito é o ser de uma pessoa ou seja aquilo que lhe pertence e corresponde como próprio e inalienável e suscita no outro o dever de respeito, da atribuição ou da restituição. A justiça é a virtude que assume este dever e lhe dá cumprimento.
Extrai sua capacidade de exigência no direito em si mesmo. O primeiro vínculo da justiça é a ordem jurídica que é um vínculo exterior e objectivo ligado à força incoercível do direito, do bem devido.
A medida da justiça é estabelecida pelo critério da igualdade na relação. O direito é um bem objectivamente tal, com independência de mim, da acolhida-adesão de minha liberdade. Como tal é fonte de ordem jurídica, distinta da ordem moral. Isto quer dizer que se pode ser justo pelo simples e formal reconhecimento e respeito do direito alheio. O direito uma vez codificado e garantido pela lei, pode ser respeitado como simples cumprimento legal, ou também como coerção da lei.
A justiça vincula a título jurídico e ético. É atitude e acto humano e como tal participa de uma ordem moral que lhe confere consistência nova.
A ordem moral não se justapõe à ordem jurídica, mas assume, integra e eleva ao nível do reconhecimento pessoal e do encontro interpessoal. O respeito formal ou legal do direito fica assim subtraído ao perigo do anonimato; a própria observância formal e legal é elevada a adesão e comprimento pessoal; a conveniência cede ou vai acompanhada da benevolência.
RELAÇÃO SOCIAL DA JUSTIÇA.
Regulação da justiça social
Tipo de relação social que a justiça social se propõe a regular.
• Sendo um conceito moral, o conceito de justiça diz respeito a realização de um determinado bem.
• Sendo assim, deve-se determinar o bem que a justiça social persegue.
• A justiça diz respeito à acção humana. Deve-se especificar, qual é o tipo de actividade em que a justiça social é aplicada.
• Em seguida, deve-se explorar como se manifestam na espécie justiça social, os elementos do género justiça: alteridade, dever e adequação.
Alteridade
• A alteridade aponta para o facto da justiça só ter lugar entre sujeitos distintos. Não diz respeito às relações do sujeito consigo mesmo.
• O dever
O dever significa que algo será atribuído a alguém por uma "necessidade racional" e não por caridade, generosidade e amizade.
• A adequação diz respeito ao modo de determinação daquilo que é devido, ou seja, a justiça proporciona um critério para a determinação do que é devido.
• A fórmula genérica da justiça se expressa nos seguintes termos: "dar a cada um o que lhe é devido".
•
A relação regulada pela justiça social: o indivíduo e a comunidade.
• A tradição identificou três: a relação do indivíduo com outro indivíduo (relação de parte com a parte);
• A relação da comunidade com o indivíduo (relação do todo com a parte)
• A relação do indivíduo com a comunidade (relação da parte com o todo).
• A justiça comutativa trata da relação entre dois indivíduos. Ela trata, portanto, na terminologia da tradição, de relações da parte com a parte no interior do todo social.
• A justiça distributiva tem como objecto as relações da comunidade com os seus membros. Ela distribui aquilo que pertence à comunidade (bens ou encargos) entre os indivíduos que a compõem.
•
• A justiça social, por sua vez, trata das relações do indivíduo com a comunidade.
• Deste modo, a justiça social, trata daquilo que é devido à comunidade e determinar quais são os deveres em relação a todos os membros da comunidade.
• Assim, a justiça social, ao regular as relações do indivíduo com a comunidade, não faz mais do que regular as relações do indivíduo com outros indivíduos, considerados apenas na sua condição de membros da comunidade.
• Objecto da justiça social
•
• A justiça social tem por objecto o bem comum.
•
• Na justiça social, visa-se directamente o bem comum. O ser humano é considerado "em comum", como diz Tomás de Aquino.
• Numa sociedade de iguais, isto significa que o outro é considerado, simplesmente por sua condição de pessoa humana, membro da comunidade.
• Assim, o que é devido a um é devido a todos, e o benefício de um recai sobre todos.
• Por exemplo, no direito ambiental, o acto de não poluir é algo devido não a este ou àquele indivíduo, mas é devido a todos os membros da comunidade.
• O direito penal, nesta perspectiva, é uma expressão da justiça social: protege-se a pessoa humana como tal, e não este ou aquele membro.
• Por isso, uma ofensa a um membro é uma ofensa a toda comunidade, e a sua punição (em alguns casos) não depende da iniciativa do indivíduo singular, mas é assumida por um órgão da comunidade.
• A existência da pena deve-se à justiça social, ao passo que a quantificação da pena fica a cargo da justiça comutativa.
A actividade própria da justiça social: o reconhecimento.
• A justiça incide sobre um determinado tipo de actividade social. Deste modo, numa actividade social de distribuição de bens e encargos, tem-se a justiça distributiva como padrão orientador.
• Na actividade de troca de bens, ou de um modo mais amplo, nas relações intersubjectivas, está presente a justiça comutativa.
• A justiça social regula uma prática social mais complexa, a prática do "reconhecimento.
• Por reconhecimento, entende-se aqui a prática de considerar o outro como sujeito de direito ou pessoa, isto é, como um ser que é "fim em si mesmo" e que possui uma "dignidade"que é o fundamento de direitos e deveres.
•
• Um sujeito de direito ou pessoa só se constitui como tal se for reconhecido por outro sujeito de direito ou pessoa: "O imperativo do direito é portanto: sê uma pessoa e respeita os outros como pessoas". A justiça social diz respeito precisamente a esta prática de mútuo reconhecimento no interior de uma comunidade.
• A justiça social suprime toda sorte de privilégios, no sentido de uma desigualdade de direitos. Cada um só possui os direitos que aceita para os outros, ou seja, cada um é sujeito de direito na mesma medida em que reconhece o outro como sujeito de direito. Na medida em que os demais membros não reconhecem os direitos de alguém, este fica desobrigado de reconhecer os direitos dos demais.
• A recusa no reconhecimento destrói a comunidade dos sujeitos de direito. Aquele que não é reconhecido como sujeito de direitos no interior da comunidade, também não é sujeito de deveres.
Na medida em que os demais membros não reconhecem os direitos de alguém, este não é obrigado em reconhecer os direitos dos demais.
A alteridade na justiça social: a pessoa humana
• Deve-se determinar o outro, que é o sujeito beneficiado na relação de justiça.
• Quanto ao sujeito da justiça comutativa é abstracto.
• Como afirma Aristóteles, "a lei somente considera a espécie do dano e trata como iguais aquele que comete a injustiça e aquele que a sofre" isto é, a lei não leva em consideração as qualidades pessoais daquele que provocou um dano e daquele que o sofreu, no momento de determinar o valor de uma indemnização.
• O sujeito que provocou o dano é considerado somente na sua qualidade de ofensor e aquele que o sofreu é considerado apenas como vítima, sendo abstraídas todas as suas qualidades pessoais e sociais.
V. TIPOLOGIA DA JUSTIÇA.
Justiça geral, justiça legal
Justiça particular: justiça comutativa e distributiva.
A justiça dá firmeza, promove e defende o direito dos indivíduos e grupos.
A justiça dá forma e alenta modos diferentes de equilíbrio, segundo os diversos direitos em jogo: justiça geral e particular, segundo os diversos sujeitos do direito e do correlativo dever: a justiça comutativa, distributiva e legal.
Justiça geral e legal
Bem comum: direito próprio da sociedade, bem de todos.
Conjunto de condições da vida social que permitem aos grupos e aos particulares alcançar a própria perfeição.
Justiça geral
Ordena as opções e os actos das partes ao bem do todo. Orienta tudo ao bem comum.
Fundamento da justiça geral e legal
Estrutura social e sociável do ser humano.
Sujeito de direito é a sociedade, cujo bem todos os membros e grupos particulares são obrigados a perseguir com o cumprimento dos seus respectivos deveres.
Justiça legal
É a justiça geral que toma corpo na lei que a codifica e formula suas exigências.
A justiça legal vincula o legislador a tornar-se em promotor e garante de leis justas
A justiça legal obriga a sociedade a observar as leis como contribuição ao bem comum.
Função da justiça legal.
Denunciar como injusta actividade particularista e classista
Transgressão da lei e evasão de suas obrigações.
Corrigir a ideia que o bem comum não é de ninguém.
Perigo da justiça legal
Influência do voluntarismo: justiça legal é um decreto arbitrário da autoridade estatal.
A justiça legal é lei positiva.
Garante da ordem constituída.
Consequência.
Justiça incrustada na lei.
Fonte de privilégios e diferenças.
O Carácter da justiça legal.
Justiça social: defende e promove o direito segundo nexos diversos, mediante os quais os indivíduos e os grupos entram em relação entre si e com a sociedade.
Defende o direito transpessoal, em benefício das pessoas em sociedade.
Justiça particular: comutativa e distributiva.
Justiça particular: comutativa e distributiva
A justiça particular: é uma virtude puramente social. Assim o homem é justo quando habitualmente não retira mais do que a sua parte dos bens em disputa no grupo social, nem menos do que a sua parte das dívidas, dos encargos e dos trabalhos.
Justiça particular
Na concepção judaico-cristã, a justiça reporta-se a Deus e à Sua Lei, que visa o Paraíso.
A Lei de Deus, critério de justiça, representa um ideal de ordem de valores e de comportamentos na vida dirigida a uma perfeição representada ou premiada com um Paraíso. É a justiça Moral concretizada na Santidade.
A justiça particular surge como um princípio de ordenação da vida em sociedade que pretende fundamentar a conduta do homem.
É a justiça particular que censura, perspectiva e hierarquiza todos os valores morais e culturais existentes na sociedade
É a justiça do bem privado: ela ordena ao bem de uma pessoa particular ou de um grupo de pessoas com personalidade moral.
Justiça particular: comutativa e distributiva
A partir do momento em que a pessoa individual ou grupo particular pode ser sujeito de direito na estreita individualidade e autonomia e como membro duma sociedade, a justiça particular assume respectivamente duas formas: a comutativa e a distributiva.
A justiça comutativa
Regula a justa relação entre pessoas singulares ou grupos de pessoas. É uma relação de justiça inter-individual onde ambas as partes são reciprocamente sujeitos de direitos e de deveres ou uma parte como sujeito de direito e outra como sujeito do respectivo dever.
Este é o tipo de justiça vigente nos contratos e nas operações de câmbio. Ela é caracterizada pela perfeita alteridade e paridade das partes e dá a cada um segundo uma avaliação numérica, aritmética, ou seja, quantitativamente bem definido (igualdade aritmética).
Função da justiça comutativa
Se a justiça comutativa rege as relações interpessoais, então a sua função consiste em corrigir os desequilíbrios que se verifiquem nas relações recíprocas entre os membros da sociedade. É a estas relações que se destina a justiça comutativa, razão pela qual esta espécie de justiça também se designa de justiça correctiva ou rectificadora.
A justiça comutativa pretende evitar que cada uma das partes contrapostas numa determinada relação jurídica receba, ou dê, de mais ou de menos. Visa restabelecer ou corrigir os desequilibrios que se verifiquem nas relações interpessoais.
Princípios da justiça comutativa
Principio de Igualdade: A justiça comutativa, que preside directamente às relações contratuais, é orientada por um critério de igualdade aritmética de natureza objectiva e também subjectiva.
Principio de reciprocidade
Se se pode exigir dos outros aquilo que se considere ser justo e que os outros exigissem de nós se nos encontrássemos na mesma situação.
Para que o vínculo jurídico que liga os diversos sujeitos que se relacionam seja justo, é necessário que estes se encontrem numa situação inicial equivalente.
Situação inicial equivalente ou seja a sua posição relativa não pode ser de molde a que um deles fique submetido ao arbítrio do outro.
Se a falta de equivalência existente entre as partes é de tal monta que uma delas actua em condições que não possam ser positivamente valoradas em termos de reciprocidade, daí resultando benefícios que não tenham justificação à luz do princípio da igualdade, a relação é uma relação injusta, viola a justiça comutativa.
Justiça distributiva.
A justiça distributiva é uma das três especies da justiça que segue o criterio de alteridade.
A justiça distributiva no geral diz respeito aos deveres da sociedade na distribuição dos bens comuns para com os seus membros.
Rege-se segundo um critério de igualdade proporcional que atende à finalidade da distribuição e à situação dos sujeitos (méritos e necessidades).
É a justiça própria das relações de subordinação e pertence ao direito público.
Alguns conceitos da justiça distributiva
Solidariedade
Subsidiariedade
Proporcionalidade
Princípio de solidariedade
A solidariedade é determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum, ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos.
Sendo assim, segundo este princípio, defende a intervenção directa do Estado, sobretudo a autoridade central na correcção das assemetrias regionais, estimulando o desenvolvimento das províncias, para que não haja províncias pobres e ricas.
Este princípio obriga que as decisões das autoridades sejam tomadas o mais próximo das pessoas, das famílias, dos grupos , (autarquias).
Ou seja o Estado deve proteger e estimular a iniciativa dos cidadãos, visando à autonomia.
Princípio da proporcionalidade
De acordo com este princípio, cada regra de Direito tem de escolher os meios adequados ao fim que pretende atingir e que justificou o seu aparecimento, não podendo optar por meios excessivos ou desajustados para o alcançar.
Ou seja,há na justiça uma ideia de proporção em que o direito positivo concretiza-se entre os factos e as consequências, entre o que se dá e o que se recebe, o que se exige e o que se presta, entre os delitos e as penas e na distribuição dos direitos e dos deveres correlativos (confere lei do Talião).
Resumindo
Tipologia da justiça: justiça geral ou legal tem como objecto o bem comum
Justiça particular: justiça comutativa há perfeita alteridade e paridade das partes, dando a cada um segundo uma avaliação numérica, aritmetica, ou seja quantitativamente bem definido.
Justiça distributiva: regula a justa relação entre a sociedade e os seus componentes, o objecto da justiça é repartir proporcionalmente os benefícos e os ónus da sociedade.
VI. INSTANCIAS ACTUAIS E NOVAS VIAS DA JUSTIÇA.
A HISTÓRIA DAS GRANDES DECLARAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS.
PERÍODOS IMPORTANTES.
A questão dos Direitos Humanos divide-se em dois grandes períodos importantes: antes e depois da 2ª grande guerra mundial.
Antes de 1945: Os direitos humanos, do ponto de vista histórico, foram conhecidos ao longo dos séculos antes de tudo uma conquista a nível nacional e só depois internacional. Foram assim formulados em Declarações, Constituições, Códigos.
Podemos citar o Código de Hamurabi (17 séculos a.C.); o Decálogo, o Édito de Nantes (13 de Abril de 1548), o Habeas Corpus (1679), a Declaração dos Direitos da Virgínia (12 de Junho de 1776), a Declaração de independência dos Estados Unidos da América (04 de Julho de 1776), a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, a Constituição da República francesa (03 de Setembro de 1791), a Constituição dos Estados Unidos Mexicanos (05 de Fevereiro de 1917).
A nível internacional antes da 2ª guerra mundial, a questão dos Direitos Humanos teve três preocupações fundamentais:
O Direito humanitário: protecção das vítimas dos conflitos armados, pela Convenção de Genebra da Cruz Vermelha, a imunidade da população civil diante do uso de armas de destruição massiva
A proibição de certas práticas degradantes e desumanas: as primeiras convenções anti-esclavagistas (sec. XIX), a primeira Convenção que proibia o tráfico de mulheres (Paris 8 de Maio de 1904),
A Protecção de alguns grupos sociais: minorias religiosas, minorias nacionais, protecção dos refugiados, das crianças.
A Assembleia da Sociedade das Nações adoptou ao 26 de Setembro de 1924 a Declaração dos Direitos da Criança (Declaração de Genebra).
DURANTES E DEPOIS DA 2ª GUERRA MUNDIAL:
As atrocidades da 2ª guerra mundial levaram o mundo a uma maior sensibilidade pelos direitos humanos e a buscar os instrumentos jurídicos para protecção dos mesmos a nível internacional.
Na Conferencia de S. Francisco a 25 de Abril de 1945 é aprovada a Carta das Nações Unidas que entra em vigor a 24 de Outubro de 1945. Esta carta oferece um quadro importante sobre os Direitos humanos.
Foi criado também a comissão dos direitos humanos. Essa comissão vai contribuir bastante na promoção e protecção dos direitos humanos. Teve o mérito de elaborar a Declaração Universal dos Direitos do Homem adoptada a 8 de Dezembro de 1948 pela Assembleia Geral da ONU, proclamando-a como o “ideal comum que se deve estender a todos os povos e nações”.
Em África a nível da OUA (Organização da Unidade Africana) temos a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, adoptada a 21 de Junho de 1981, pela cimeira de Nairobi da OUA tendo entrado em vigor a 21 de Outubro de 1986.
Foi criada a Comissão africana dos Direitos do Homem e dos Povos pela Conferência dos Chefes de Estados e de Governo em 1987.
A elaboração dessa Carta obedeceu a dois princípios fundamentais que estão na base do Direito internacional dos direitos do homem: o Universalismo e o regionalismo.
O primeiro principio evocado na Declaração de S. Francisco, foi proclamado pela Declaração Universal dos Direitos do Homem e pelos pactos e Convenções internacionais relativos aos direitos humanos.
O Carácter universal específico dos direitos humanos provém da própria essência do homem. Apesar das suas diferenças socioculturais, o homem é sempre homem em todas as partes do mundo.
Quanto ao princípio do regionalismo, deve-se aos aspectos particulares e específicos do continente que não podem ser ignorados quando se trata de traçar estratégias para a promoção e tutela dos direitos humanos.
JUSTIÇA E DESENVOLVIMENTO.
Nova consciência da Justiça.
A característica da nossa sociedade é o progresso intensivo da ciência aplicada à técnica cujo fim é a produção de bens e serviços gerais que visam o bem-estar. Diante deste quadro, há nova consciência da justiça: o compromisso com o desenvolvimento.
O compromisso com o desenvolvimento é uma consciência nova e específica pelo carácter historicamente inédito desta evolução relativamente às estatísticas e de subsistência das sociedades pré-industriais.
É uma consciência urgente e permanente por causa do ritmo incessante e frenético do progresso que se vive em quase todos os países do mundo.
Torna-se desta feita, uma consciência atenta e exigente pelas inexploradas e surpreendentes possibilidades de fabricação de coarctadas e necessidades e pela elevação da qualidade de vida.
Estas possibilidades e elevação de nível de vida fruto do progresso não devem ser nem privilégios e fortunas de pessoas num país nem de países com relação aos outros. Estas possibilidades devem ser entendidas como direitos das pessoas e dos povos.
Por isso, estes bens e direitos das pessoas devem formar parte das exigências da justiça e do exigível.
O desenvolvimento é um direito de todos os homens porque é por ele que passa a realização das esperanças humanas.
Assim, a acção pela justiça converte-se em grandioso compromisso de garantir o desenvolvimento, de permitir a todos a participação equitativa em seus benefícios
Esta nova consciência contradiz a lógica dominante no mundo desenvolvido em que os não produtivos e não competitivos são deixados de fora.
Trata-se de pessoas, grupos humanos e povos inteiros, que uma cultura economicista e baseada na eficiência do desenvolvimento tende a excluir dos benefícios do progresso e reduzir a condições de vida inter-humanas.
O próprio desenvolvimento quando não acompanhado de justiça, gera injustiças causando manifestações, contrastes e conflitos até à violência.
Assim sendo, só a justiça possibilita o progresso harmónico de todos, favorecendo o desenvolvimento de acordo com o direito, participando na promoção e na consolidação da paz social, dai que o desenvolvimento seja o novo nome da paz.
Por isso, não é um dado adquirido de que há países predestinados ao subdesenvolvimento, como o mundo o caracteriza: países desenvolvidos e subdesenvolvidos.
A nova consciência da justiça defende que não se trata de uma expressão fisiológica do sistema ou de um sistema natural.
O subdesenvolvimento dos povos e nações é uma injustiça; e, como toda justiça deve ser reparada e satisfeita reintegrando o direito violado.
É o direito que todos os homens têm, as comunidades e os povos a beneficiar-se do desenvolvimento, do que produzem, dos mecanismos que o produzem, como condição de promoção humana.
JUSTIÇA E LIBERTAÇÃO.
• O desenvolvimento mede-se com a realidade do impacto e com o modelo de identificação.
• No impacto com a realidade de atraso, de miséria, de exploração, o desenvolvimento ou carece de ancoradouro, por falta de condições estruturais mínimas e básicas, ou redunda em beneficio exclusivo dos poderosos. É injustiça.
• Esta é a razão por quê, entre as nações em vias de desenvolvimento emergiu uma nova instância de justiça como libertação, como liberdade de toda forma de miséria e vexames que impede estruturalmente a homens e a povos toda a emancipação e promoção.
• A primeira via de desenvolvimento é a libertação da extrema pobreza, de opressão económica, política e cultural.
• Surgiu a questão de modelo de desenvolvimento: imerso numa cultura que privilegia o ter, o desenvolvimento terminou por acreditar uma imagem redutora do progresso humano.
• Estas sociedades projectaram um modelo economicista e consumista.
• A libertação é o novo nome do desenvolvimento. Dadas as condições de miséria e opressão em que se encontram povos inteiros e dada uma cultura do desenvolvimento humanamente empobrecedora, a justiça do desenvolvimento deve ser vivida como compromisso de libertação.
• O desenvolvimento autêntico é: integral, promove o humanismo completo.
• Um desenvolvimento económico escraviza o homem
• Um desenvolvimento que não inclua as dimensões culturais, transcendentes e religiosas do homem e da sociedade, não liberta.
• O ser humano é totalmente livre somente quando é ele mesmo, na plenitude de seus direitos e deveres; o mesmo vale para toda a sociedade em seu conjunto.
• JUSTIÇA E SOLIDARIEDADE
• FUNDAMENTOS DA SOLIDARIEDADE.
• Os homens e os povos são cada vez mais interdependentes e o mundo caminha para a unificação (organizações internacionais e regionais),
• Diante desta realidade, a acção pela justiça converte-se em demanda exigente e em compromisso eficaz de solidariedade em todos os níveis.
• O entrelaçamento das interdependências e a unificação social por obra dos modernos meios de comunicação e de interacção devem converter-se em integração econômico-política, seguindo uma dinâmica expansiva de cooperação e de compartilha social.
• Com efeito, quanto mais se unifica o mundo, tanto mais superam as obrigações as obrigações das pessoas os grupos particulares, estendendo-se progressivamente ao mundo inteiro.
• São as obrigações de justiça, a qual faz cargo da qualidade humana da actual socialização do mundo, a fim de que esta não se decida em detrimento dos mais fracos, mas envolva todos num progresso social harmónico.
• A solidariedade deve ser uma exigência e compromisso de justiça em todas as nações e sociedades, assumindo desta forma o carácter de programa e de estrutura política, sendo que as ajudas e as aportações são consideradas como direitos e deveres que comprometem os membros de uma comunidade a uma repartição equitativa. É o estado de direito.
• A solidariedade é uma questão de justiça a nível transnacional porque há povos que estão necessitando de ajudas e contribuições e estas são uma questão de sobrevivência para estas pessoas.
• Ou em países onde há o vazio de uma autoridade política supranacional e de uma justiça internacional eficiente tornando inúteis as melhores declarações e intenções, deixando à mercê da espontaneidade e da conjuntura toda a expressão concreta da solidariedade.
• Neste tempo predominam os interesses nacionais; os direitos do veto dominam politicamente os deveres de consenso.
• Comunica-se cada vez mais, no entanto, compartilha-se muito pouco.
• Hoje urge resolver a questão do bem comum universal e com poderes públicos, estruturas e meios mundiais.
• Estes puderes públicos devem estar em condições de actuar de maneira eficiente em escala mundial.
• O desenvolvimento integral do homem não pode ter lugar sem o desenvolvimento solidário da humanidade.
• A justiça esta atenta à promoção de toda a pessoa e ao bem de todas as pessoas e da comunidade humana, superando qualquer fronteira, étnica ou temporal:
• Temos obrigações para com todos e não podemos desinteressar-nos dos que virão depois de nós e engrandecer o recinto da família humana. A solidariedade universal, que é um facto e para nós um benefício, é também um dever.
• É um dever de justiça que busca o direito da pessoa. Busca o direito dos povos. A obra da justiça será a paz, a acção do direito, a calma e a tranquilidade perpétua.
VII. A JUSTIÇA SOCIAL NA DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA.
Encíclicas sociais
• Quadragesimo anno
• Divini Redemptoris
• Rerum Novarum
• Laborem Exercens.
• Populorum Progressio
• Sollicitude Rei Socialis
Quadragésimo anno.
• A Encíclica Quadragesimo anno de Pio XI, de 1931, é a primeira das Encíclicas sociais a utilizar o termo "justiça social".
• O conceito Justiça Social é aplicado à esfera económica, para avaliar a distribuição de renda e riqueza.
• A justiça social tem a universalidade da justiça legal: todos têm obrigações em relação ao bem comum.
• Assim, "é contra a justiça social diminuir ou aumentar demasiadamente os salários em vista das próprias conveniências e sem ter em conta o bem comum".
• Os operários, na sua luta por melhores salários, devem estar atentos para que o mercado de trabalho não se veja encolhido por pretensões inviáveis economicamente: "os salários se regulem de tal modo, que o maior número de operários possa encontrar trabalho e ganhar o necessário para o sustento da vida.
• Assim como todos são os obrigados, todos são beneficiados, uma vez que o bem comum é o bem de todos, sendo realizado somente "quando todos e cada um tiverem todos os bens que as riquezas naturais, a arte técnica, e a boa administração económica podem proporcionar.
• Na ordem económica, a fórmula da justiça social seria então: "todos os bens necessários para todos".
• O conceito de justiça social aplica-se também na esfera da vida da sociedade, pois as instituições públicas adaptarão a sociedade inteira às exigências do bem comum, ou seja, às regras da justiça social.
Divini Redemptoris.
• Na Encíclica Divini Redemptoris, de 1937, Pio XI repete a ideia de que a justiça social deve reger toda a sociedade, não se restringindo a orientar a dimensão económica: a justiça social deve regular "a ordem económica e a organização civil.
• Mas o mais importante nesta Encíclica é a definição de justiça social: "É precisamente próprio da justiça social exigir dos indivíduos quanto é necessário ao bem comum.
• Retoma-se a definição de Tomás de Aquino da justiça legal: "A justiça legal ordena o homem imediatamente ao bem comum.
• As exigências que recaem sobre cada um dos indivíduos supõem que estes estejam em condições de contribuir com a comunidade a que pertencem:
• Não se pode prover ao organismo social e ao bem de toda a sociedade, se não se dá a cada parte e cada membro, isto é, aos homens dotados da dignidade de pessoa, tudo quanto necessitam para desempenharem suas funções sociais.
• A justiça social exige de cada um aquilo que é necessário para a efectivação da dignidade da pessoa humana dos outros membros da comunidade, ao mesmo tempo em que atribui a cada um os direitos correspondentes a esta dignidade.
• A justiça social considera o ser humano simplesmente na sua condição de pessoa humana, nos seus direitos e deveres humanos.
Aplicação prática do conceito.
• As consequências extraídas deste conceito são radicais: para a justiça social, os seres humanos, considerados como pessoas, são iguais e, portanto, toda desigualdade em aspectos constitutivos da pessoa, como é o caso das suas necessidades materiais básicas, deve ser afastada.
• Assim, na previdência social, deve ser buscada, por uma exigência de justiça social, a maior igualdade possível entre os benefícios: "não corresponde às normas da justiça social e da equidade o estabelecimento de um sistema de seguros e de previdência social para os agricultores, inferior ao das outras categorias sociais. Assim, pois, os regimes de seguro e de previdência em geral não devem diferenciar-se notavelmente, qualquer que seja o sector em que os beneficiários exerçam a sua actividade ou de que tirem seus proveitos.
• Assim, pois, os regimes de seguro e de previdência em geral não devem diferenciar-se notavelmente, qualquer que seja o sector em que os beneficiários exerçam a sua actividade ou de que tirem seus proveitos.
• A previdência deve ser considerada como "um bom instrumento para atenuar a diferença entre as diversas classes sociais."
• O conceito de justiça social, na ética social cristã, faz exigências bem precisas, portanto, excluindo a possibilidade de receber qualquer conteúdo: a consideração do ser humano apenas na sua condição de pessoa exige que todos sejam considerados na sua igual dignidade.
• No plano socioeconómico, isto significa igualdade material.
NOVAS PERSPECTIVAS E NOVAS IMPLICAÇÕES DA JUSTIÇA SOCIAL
Quais são as principais linhas de forças da justiça e da questão social no Magistério sucessivo a Pio XI?
No pensamento de João XXIII o primeiro elemento a realçar é a acentuada relação estabelecida entre a justiça social e a promoção da dignidade humana.
Por exemplo, na Enciclica Mater et Magistra, nota-se que João XXIII justifica a partir da natureza humana ou da dignidade do homem a sua invocação do binómio justiça-equidade em relação ao problema dos salários, da segurança social, da melhor distribuição dos bens.
O segundo elemento aparece com a Pacem in Terris (1963) onde vem delineado com precisão o significado da dignidade da pessoa humana: a dignidade do homem enquanto pessoa dotada de inteligência e vontade livre, implica também direitos bem precisos e a ordem social funda-se no reconhecimento desta dignidade.
O terceiro elemento resume-se no alargamento do problema da justiça sócia para uma escala mundial e o respectivo aprofundamento do sentido do humanismo cristão. Neste sentido afirma João Paulo II: “ Se considerarmos a evolução da questão da justiça social, deve-se notar que, enquanto no período que vai desde a Rerum Novarum até Quadragésimo Anno de Pio XI, o ensinamento da Igreja concentra sobretudo em torno da justa solução da chamada questão operário no âmbito de Nações singulares, na fase sucessiva esse alarga o horizonte às dimensões de todo globo. A distribuição desproporcional da riqueza e da miséria, a existência de Países e de Continentes desenvolvidos e não, exigem uma perequação e busca de vias para um justo desenvolvimento de todos.
Neste sentido, a Populorum Progressio (Paulo VI, 1967), na sua temática geral, atribui à justiça social, em virtude da dimensão mundial da questão social, o condão de promover o humanismo plenário, ou seja de dar impulso à organização da solidariedade universal para o desenvolvimento integral de cada homem e da humanidade inteira.
Por seu turno, na Sollicitudo Rei Socialis (João Paulo II, 1987), o Papa diz que a justiça social implica até a libertação da pessoa humana e afirmação dos seus direitos, não só em alguns países, mas em todo o mundo.
Síntese:
1. O gonzo sobre o qual gira toda a problemática da justiça social é o bem comum; este aparece como o conceito-chave e o objecto principal da justiça social.
2. O critério de actuação desse bem comum é a convergência de todos os factores para a promoção e enriquecimento da dignidade de cada pessoa humana.
3. O próprio bem comum define-se no âmbito global da inteira família humana.
4. O bem comum confere à justiça social um carácter dinâmico que a leva para além dos resultados obtidos, estimulando-a sempre mais a promover e a proteger o próprio bem comum contra toda e qualquer legislação rígida e fossilizante, por meio duma adequação contínua das instituições e das estruturas às suas exigências sempre novas.
5. A promoção da justiça social é apenas um aspecto dum compromisso mais global da Igreja que visa a salvação integral de todo homem e do homem todo, a partir do próprio chão-da-vida.
O Docente
Gaudêncio Sangandu.
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